sexta-feira, novembro 27, 2009

Hoje eu acordei com medo, mas não chorei!!!

Tive vontade de escrever alguma coisa. Acordei com o Poema, de Cazuza na cabeça. Cantarolei a letra. Diz tudo que eu queria dizer por isso posto.

Eu hoje tive um pesadelo
E levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo
E procurei no escuro
Alguém com o seu carinho
E lembrei de um tempo

Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era ainda criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou consolo

Hoje eu acordei com medo
Mas não chorei, nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via o infinito
Sem presente, passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim
E que não tem fim

De repente, a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio, mas também bonito porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás

terça-feira, outubro 27, 2009

Dos ventos de Campinas

Adoro os dias de primavera como os que vejo agora. Da janela lateral uma árvore frondosa balança ao ritmo de um vento suave, jogando suas flores amarelas sobre a calçada. Uma das manhãs mais bonitas que Campinas me deu. Um movimento tão poético, quanto o sentimento que alimento agora. Tão sereno quanto o vento que toca meu rosto e tão sutil que muitos olhos apressados não conseguem perceber. Por hora sei que meu dia começa melhor e com a certeza Campinas me traz bons ventos. Se ainda há quem prefira se ocupar dos detinos alheios, desejo que ganhem força os versos de Fernando Pessoa: "Segue o teu destino/ Rega as tuas plantas/ Ama as tuas rosas. /O resto é a sombra de árvores alheias."

domingo, setembro 13, 2009

Hipérbole

Da última vez que havia decidido parar de escrever aqui - mais ou menos em fevereiro de 2008 - o motivo era uma tristeza momentaneamente sem solução. Depois segui para um momento de transição e para outro de muitas alegrias. Parei de escrever porque estava feliz.

Agora entre as alegrias e as tristezas encontro refúgio nos momentos de reflexão. Nada é linear, nem sentimentos ruins, nem os bons. Ainda bem, pois ninguém aguentaria uma vida idiotamente feliz ou uma mergulhada em tristezas. Passadas as justificativas, que escrevo mais para mim mesma que para os possíveis leitores, volto a escrever para racionalizar a vida...

Eu sou uma hipérbole. Ora demasiadamente alegre, ora inutilmente triste. Nesse jogo de extremos, percebi que pequenas coisas que incomodam e são ignoradas - talvez para adiar esse momento de reflexão - tornam-se grandes em determinado momento. Como pequenos átomos que se unem para explodir de repente, estou agora. Tudo por uma pequena, talvez insignificante decepção. Descobri então, que mudei de fase. Antes estava com Cazuza quando ele diz que as mentiras sinceras interessam e até escrevi isso aqui no blog alguns anos, meses ou semanas atrás. Agora não mais! Descobri que quero me jogar na vida me despindo das pequenas ilusões.

O problema é que por consequência, passo a esperar isso das pessoas. O que é um erro. Eis a grande dificuldade de amar - se entregar, sem saber onde está caindo! Sem saber o que receberá de volta. Talvez a própria existência seja o aprendizado e a trajetória se encarregue de dar as lições. Por hora, carrego as incertezas e as dúvidas, que ainda conseguem ferir sentimentos e trazer dificuldades. Que até seriam pequenas, não fosse eu mesma uma hipérbole.


sábado, junho 06, 2009

Flores que colho, ou deixo...

Cada dia que passa penso que mais acertada foi a escolha do nome deste blog. Pensar sobre a vida nos leva a pensar sobre as flores que colhemos ou deixamos. É assim a trajetória, com pessoas que vem e vão, hábitos que vem e vão, lugares que vem e vão e momentos que vem e vão. Ao final de tudo temos a essência: a nossa própria vida, a nossa história escrita. Uma história cruzada com tantas outras, afinal, ninguém no mundo deixa de marcar outras histórias.

Valorizar tudo isso, faz de mim praticamente uma roteirista de novela frustrada, acredito! (rs) De qualquer maneira, vale ressaltar a beleza da vida e das histórias de vida. Por isso costumo dizer, toda vida daria um livro, do operário ao revolucionário, da dona de casa à presidente chilena Michelle Bachelet
. Toda trajetória é rica, mas não mais que uma trajetória. Assim, os próprios versos de Ricardo Reis (heterônimo do Pessoa) voltam oportunamente a este blog homônimo. Segue.


Ricardo Reis

Flores que colho, ou deixo...

Flores que colho, ou deixo,

Vosso destino é o mesmo.

Via que sigo, chegas

Não sei aonde eu chego.

Nada somos que valha,

Somo-lo mais que em vão.

sexta-feira, junho 05, 2009

DESACelerando...

Sem que a gente perceba a vida entra numa velocidade louca. Até um ponto em que fica descontrolada.... as ações tornam-se automáticas e os porquês se perdem no caminho...........
Nessa hora é preciso desacelerar...
ir parando, parando, parando...
até parar!!!

Parar e pensar se esse é mesmo o caminho
<-------- ou é preciso alterar a rota! ------------->>>>>>>

??!!!!!????!!!!

terça-feira, junho 02, 2009

vida e tempo

Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és...

Há uma genialidade a mais nesses versos do Cartola. O mundo é um moinho e o que ele provoca na gente é a perda da pureza inicial. Pulamos de cabeça nas primeiras experiências da vida. Nos amores, nas amizades, nas experiências profissionais. Tudo é novo e tudo atrai como um vagalume na escuridão. Com o tempo e com a vida já vivida passamos a desconfiar do vagalume e olhar com cautela tudo que nos chega. Está tudo carregado de passado, está tudo transbordado de "poréns". Para viver, depois de um tempo, é preciso descartar. Aceitar o que somos após passar pelos moldes da vida e descartar o que nos prende a tudo que não é mais. A tudo que já foi. Só assim seguiremos e mesmo assim, o Cartola, ainda tem razão: em pouco tempo não serás mais o que és...

terça-feira, maio 12, 2009

Pensamentos

Não dá pra chegar numa estrada nova sabendo onde ela vai dar. Dá apenas para desejar e acreditar que o caminho leve a bons lugares e que os passos sejam acertados. Que a estrada seja essa, seja minha e não um atalho ou remendo qualquer. Tem coisas que não consigo expressar. É isso! Códigos, hábitos, truques, manias...

Eu quero te dar
E quero ganhar o que você me der
Eu quero te amar
Até não saber mais o que isso é
Eu quero querer
Igual a você assim sem disfarçar
E quero escrever
Uma canção de amor para nos libertar

De todos os códigos, hábitos, truques, manias
Que insistem em estar
No meio, no centro, no canto da gente
Em lugares que eu não quero andar
De cada imagem errada
Que a velha palavra usada nos trás
De tudo que signifique
Que para sermos um temos que ser iguais

(Moska)

sexta-feira, maio 08, 2009

Estranhamentos e adaptações

Cada pessoa que entra na nossa trajetória traz um mundo todo diferente para somar ao nosso. Nesse processo de associação, alguns estranhamentos são naturais e logo surgem. Jeito de ser, de encarar a vida, as situações, histórias. Tudo surge como uma nova pintura da vida na nossa frente. Estou nesse processo e, pensando nele, percebi que deixar o novo chegar é um processo também de revisão do nosso próprio mundo.

Aceitar o novo é um mexer no nosso próprio jeito de encarar a vida, é um exercício que chega a incomodar, afinal é muito mais fácil deixar como está. Porém, quando eu penso o quanto esse mundo novo pode acrescentar alegrias e momentos felizes, decido encarar a novidade e deixar o coração aberto. E, ainda que me sinta incomodada por mexer no que antes estava quieto, deixo que tudo seja revirado. Pois é depois da reviravolta que surge uma nova configuração mais bonita e harmônica que antes. É hora de mexer, ajeitar, revirar e aprender. É tudo novo, de novo!

terça-feira, abril 07, 2009

Frida Kahlo


Tenho pensado muito sobre o feminino e várias questões relacionadas a gênero (reflexo do mestrado, talvez). O legal é que nessa fase volto a Frida Kahlo só para lembrar que há mesmo muita beleza no ser mulher! Uma imagem que diz muito...

segunda-feira, abril 06, 2009

O que será que será?

O que será que será?
O que não tem certeza, nem nunca terá...
O que não tem conserto, nem nunca terá...
O que não tem tamanho...

sexta-feira, abril 03, 2009

Um amor pra toda vida (?)

Lillian Bento

Embalada pela velha mania de observar o comportamento humano e aproveitando uma fase sex in the city da vida (única coisa q tenho visto na TV ultimamente), quero escrever hoje sobre o amor! Ah, lá vem frases melosas e linhas sentimentais!!! Não. Nada disso. Longe disso. O quero falar é sobre as primeiras impressões de uma mulher sobre o amor, tão logo ela começa a se perceber como uma mulher - o que na minha adolescência seria por volta dos 18 anos, mas a cada ano essa idade fica menor, 15 ou 13 para algumas.

Agora há pouco observava no orkut o perfil de uma amiga da minha prima, que aos 18 anos fez um álbum de fotos do seu primeiro namorado. Com o título "Demorei muito pra te encontrar...", uma alusão à música de Vinícius Canturária, que ficou conhecida na voz de Fábio Jr. Demorou muito? É realmente 18 anos é muito tempo para viver sem o tal amor ideal. Todas as fotos, obviamente, traziam comentários de outras garotas da mesma idade. Uma delas dizia: "Amiga estou tão feliz por você!". Fiquei pensando por quê? Porque ela encontrou o grande amor, um companheiro ideal, mesmo sem saber o que seria um companheiro ideal.

Qual o problema da maneira apocalíptica com que adolescentes se entregam às paixões pueris? Nenhum. O que me intriga é a educação que, vai geração vem geração, continua a ensinar a mulher que a satisfação e realização pessoal é encontrar um homem, casar e conhecer a felicidade, que mesmo se não for tão real assim precisa ser mostrada, apresentada em álbuns de orkut, em mensagens apaixonadas e em frases românticas.

Neste nascer para a vida adulta e para os amores, fica uma lacuna para as meninas que não encontram o tal homem perfeito e começam a bater cabeça em relacionamentos frustrados. Para meninas que descobrem que gostam de meninas (essas devem sofrer muito) e simplesmente para quem escolhe deixar de lado essa tal necessidade de amar subitamente e estudar, trabalhar e investir em outras prioridades.

Claro, há exceções e mesmo quem não ligue para tais imposições sociais. Mas a mim, incomoda essa ideia de realização no outro, não porque não deva ser buscada, alcançada e vivida, mas porque a necessidade de ter alguém para mostrar e apresentar à sociedade pode deturpar a visão do que seja de fato o amor. E o que é? Eu sei? Não há como definir, mas prefiro ficar com o sentido filosófico do amor, um amor que está além das aparências ou da beleza exterior.

Um amor que não precisa dar satisfação, mas sim ocupar o espaço que falta na alma de alguém. Fiquei a pensar, se apresentar a experiência de Sartre e Simone de Beauvoir aos estudantes ainda no ensino médio não seria uma saída. Um exemplo de amor não compreendido pela Igreja Católica, mas que mostrava a importância de reconhecer no outro alguém necessário e respeitar as diferenças que este outro carrega. Ou mesmo a concepção de amor de Platão, pouco compreendido no senso comum.

A maioria das pessoas acredita que o amor platônico é o amor impossível, enquanto o que Platão sugeria era que o amor verdadeiro é o que supera o transitório, supera o momento e transcende. Tal sentimento não é necessariamente direcionado a alguém no sentido sexual e pode dizer respeito a qualquer campo da vida. Se tais palavras seriam aproveitadas por alguém no início da vida adulta não sei, mas já começariam a delinear a ideia de que amar é compartilhar com alguém, é estar com alguém e não TER alguém.

Não tenho, nem de longe, a pretensão de dizer o que é o amor, até porque tal definição não existe e o amor não está pronto, precisa ser conhecido, experimentado. É um processo gradual, que talvez tenha mesmo que começar de maneira apocalíptica. Vai saber....

sábado, março 21, 2009

Because

Why do I feel happy?

Because the world is round it turns me on
Because the world is round...

Because the wind is high it blows my mind
Because the wind is high...

Love is old, love is new
Love is all, love is you

Because the sky is blue, it makes me cry
Because the sky is blue

(John Lennon)

terça-feira, março 03, 2009

Tristezas folgadas

Quando uma tristeza vem. Deixe ela chegar, dê espaço e deixe que ela fale tudo o que tem a dizer. Abra os braços e abrace-a, mas diga logo que o tempo é curto. É preciso que ela seja breve e você firme, caso contrário ela pode te pedir para ficar mais, passar uma noite, o dia seguinte e até te convencer a deixá-la ficar. Se der espaço, logo chega outra. Elas são unidas. E se se sentem confortáveis logo se acumulam em seu peito até o limite do sufocamento. Até lhe faltar espaço para receber as alegrias, mais fulgazes e menos invasivas, porém bem mais agradáveis. Portanto, se receber a visita da tristeza, fique atento. Dê a ela o tempo mínimo necessário e a mande ir. Deixando bem claro: uma de cada vez!

=) Lillian Bento!!!

quarta-feira, janeiro 21, 2009

Um plágio ou a metamorfose de um relato real

Por Lillian Bento

Parte 1: O encontro

Um vulto, outro vulto, outro vulto. Esta era a visão que Benedita tinha do centro da cama forrada com lençóis de cetim barato e vermelho de onde observava o vidro fosco da porta. Ela retocava o esmalte grená e ouvia no rádio baladas sertanejas enquanto aguardava que um daqueles vultos que passavam pelo corredor parasse diante da porta de sua suíte e entrasse subitamente para lhe tomar nos braços.

Um vulto, outro vulto, outro vulto. O movimento continuava enquanto Benedita passava o tempo imaginando quem seria o próximo homem a entrar ali e surpreendê-la com um buquê de rosas cor-de-rosa tal como sonhara durante toda a adolescência. Do auge de seus 36 anos, aquela mulher de estatura mediana e ancas avantajadas com a pele já maltrada pelos anos, mas carregada de maquiagem, sonhava como uma garota de 16 e aguardava a chegada do homem perfeito. Não precisava ser um príncipe, repetia para si mesma, mas alguém que a levasse para um passeio de mãos dadas em uma praça qualquer e a buscasse no trabalho.

- Alguém que me buscasse no trabalho! Suspirou. Isso sim é prova de amor, mandar flores nem tanto, mas ser esperada na saída do trabalho é o sonho de toda mulher - pensava alto.

Um vulto, outro vulto, outro vulto. Parou. A batida estridente na porta enferrujada interrompeu os pensamentos de Benedita. Ela escondeu os esmaltes, ajeitou o lençol, tirou o sutiã e se deitou sobre na cama cor de sangue com as ancas para cima, uma mini calcinha fio dental com estampa de oncinha e uma sandália dourada salto 15.

- Keila? perguntou o homem de barba cerrada, rosto marcado por expressões do tempo que vestia uma camisa de um tecido azul claro aberta até a altura do umbigo a exibir a protuberante barriga que lhe adornava a estrutura de pessoa magra. Aparentando não ter mais de 40 anos ele mantinha o olhar nos pés, como quem quisesse fugir da realidade que lhe cercava em paredes cobertas de mofo que marcava aquele reduto de luxúria da periferia da cidade.

-Olhe para mim... toque meus seios que te esperam - respondeu Benedita que se fizera a insinuante Keila com a entrada daquele estranho estranho.

-Tire a roupa

-Já estou quase sem

-Então vista mais roupas e tire-as

-Entendi, respondeu Keila, que aumentou o volume do velho rádio e embalada pela música sertaneja vestiu um pequeno vestido de cetim vermelho com zíper nas laterais e começou a se despir.

Tímido, o estranho ele olhava por cima dos óculos sem mover a cabeça que ainda mirava o chão.

Ela deitou-se na cama separando as pernas e exibindo-lhe toda sua nudez. Ele se aproximou e sentou na cama a lhe acariciar a barriga.

-Meia hora é 100. Completo é 130, disse Keila sem resposta. Ele continuou a lhe acariciar a barriga.

Em um movimento brusco, Keila o agarrou e fechou o homem entre suas pernas. Ele a empurrou com a mesma rapidez e sentou novamente na cama sem nada dizer.

-Já se passaram meia hora. Tá perdendo tempo e dinheiro, disse Keila já com um ar de irritação.

Em uma tentativa de estimular o cliente ela ajoelhou-se na cama e começou a acariciar o próprio corpo com as mãos embebidas com um óleo de amêndoa barato que estava na cabeceira da cama.

- Obrigada. Disse o homem que abriu a carteira, deixou 200 reais no lençol e saiu deixando a agora Benedita sem entender.

- Tá, quer me dar dinheiro fácil tudo bem, disse enquanto vestia a calcinha.

Ela deitou-se novamente e pegou um livro de palavras cruzadas para passar o tempo e esperar o próximo. Um vulto, outro vulto, outro vulto. Veio o próximo e três outros próximos naquele dia
que gozaram, pagaram e foram embora após dizer meia dúzia de palavras eróticas e ofensivas.

Era exatamente meia noite quando Benedita deixou a casa onde trabalhava para tomar o trem e seguir para a kit que dividia com outras três amigas que conhecera na prostituição. Na pracinha em frente à casa, que tinha fachada de boteco e um letreiro que dizia: Dose de amor, estava sentado o estranho cliente, que ainda fitava o chão e mexia os sapatos.

Ao ver Benedita ele levantou-se e a chamou pelo nome em voz alta.

-Quem lhe disse meu nome?

-Você

- Tá louco? Quando?

- Há 25 anos exatamente

Ela parou, sentiu seu corpo estremecer e com um frio na barriga se aproximou e retirou os óculos do rosto dele em um movimento suave e tímido das mãos. Pela primeira vez o homem ergueu o olhar e fitou os olhos negros de Benedita, manchados de maquiagem velha. Sem dizer nada, ele lhe acariciou o rosto e a beijou na boca. Atônita e se sentindo como uma adolescente, ela lembrou daquela figura enigmática que marcara sua adolescência e correspondeu o beijo.

- Jorge. Como me encontrou?

-Eu procurei por você. E a encontrei em uma vida muito diferente da que imaginara, mas com o mesmo brilho e vitalidade de seus 12 anos. Meu coração disparou como na época do colégio e me recusei a olhar para você.

-É estranho ver você tanto tempo depois.

-Imagino, não tenho mais a juventude de antes

-E eu caí na vida, como você pode ver
-Não me importo com isso. Também estive envolvido em uns negócios arriscados

-Que negócios?

- Bolsa de valores. Eu me tornei um jogador do mundo financeiro, me arrisco com ações e algumas mercadorias. Não vale a pena explicar.

- Porque está aqui na porta do meu trabalho?

- Estava esperando você sair

- Me esperando na porta do trabalho? - suspirou a lembrar dos sonhos pueris

-É. Queria te ver mais uma vez. Além do mais, não tenho onde passar a noite, resolvi ficar aqui debaixo desta árvore.

-Não tem pra onde ir? Pode ir pra minha casa, não é grande coisa e eu precisaria falar com as meninas que moram comigo, mas acho que tá limpo. Vamos?

-Não estou em condições de recusar, fui despejado da casa onde morava e agora preciso ajeitar minha vida. Obrigada, Benedita. - disse Jorge a lhe beijar todo o rosto.

- Onde você estava morando? Perguntou a curiosa Benedita.

- É uma longa história. Eu te conto assim que amanhecer o dia. Estava no Acre e vivi uns tempos na Bolívia. Vou te explicar tudo mais tarde, minha Ditinha. E por falar nisso Keila é um bonito nome, disse rindo.

Ele tomou as mãos de Benedita, que viu em minutos realizados dois de seus sonhos de juventude.

Parte 2: O desencontro

Ao chegar na casa de Benedita - um quarto grande dividido em três partes em um pequeno prédio de kitnets, Jorge acomodou-se ao lado de Benedita em sua pequena cama de solteiro.

- Porque não fica naquele quarto de hoje a tarde? Parece maior e mais aconchegante

- É alugado. Sete reais por hora utilizada, muito caro.

- Não quero mais que volte àquele lugar

- Mas acabamos de nos reencontrar

- Por isso mesmo, eu te reencontrei e agora é minha mulher. Quero começar uma vida nova e você esta comigo. Amanhã mesmo saio a procura de emprego e você não trabalha mais

A decisão unilateral de Jorge assustou Benedita, que apesar do medo sentiu-se feliz por ter pela primeira vez alguém que se oferecesse para cuidar dela.

-Ele pegou na minha mão e me esperou no trabalho, pensava enquanto tentava dormir.

No dia seguinte, Benedita não voltou ao Dose de Amor e nem ligou para dizer que não pretendia ir mais. De manhã, Jorge saiu como prometido e deixou um bilhete para Benedita:

“Keilinha minha, volto mais tarde com as novidades. Mil beijos,minha Benedita.”

Sentindo-se leve e feliz, keila passou o dia a limpar a kitnet como há tempos não fazia. Foi até a lojinha da esquina e comprou três arranjos de flores de plástico, frutas, e aromatizante para o ar. Limpou a casa toda para esperar seu novo e súbito amor. Preparou-lhe um jantar com o que de melhor sabia fazer na cozinha: lasanha.

Vestida em seu melhor vestido - feito de organza cor-de-rosa e com uma rosa da mesma cor nos cabelos negros, Benedita esperou. Da janela via passar os vultos e nenhum deles parava. Um vulto, outro vulto, outro vulto. Até que adormeceu sentada na mesa. Acordou com a estridente voz de Neusa, sua companheira de quarto.

- Que mesa linda, Bené! Preparou pra gente? Disse enquanto tirava o salto agulha e se despia.

- Preparei para minha imaginação - respondeu lacônica.

Vestiu-se com uma calça de couro, uma blusa vermelha e voltou ao Dose de amor. Na porta o dono a esperava:

-Porque faltou ontem sem avisar?

-Tive dor de estômago.

- Não vacile ou vai perder o ponto

-Eu sei.

Entrou na suíte, bateu a porta. Ligou o rádio. Deitou-se na cama e olhou para a porta. Um vulto, outro vulto, outro vulto.